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quinta-feira, 22 de setembro de 2016

Mafalda Minnozzi realiza show em comemoração aos 20 anos no Brasil



A cantora italiana Mafalda Minnozzi faz show nesta sexta (23) em São Paulo para comemorar seus 20 anos no Brasil. 
Ou melhor, numa ponte aérea constante entre Brasil e Itália. "Já fiz a viagem de ida e volta umas 80 vezes", conta Mafalda à Folha. "Durante um tempo, gastava tudo que ganhava nisso." Tanta dedicação á missão de mostrar uma música italiana de qualidade do outro lado do Atlântico nasceu na primeira visita ao Brasil, para uma temporada no Rio, quando foi incentivada por Chico César e Renata Russo. Ela intensificou as visitas e as coisas começaram a acontecer. Emplacou músicas em novelas e colaborou com grande parcela da melhor MPB, como Martinho da Vila e Milton Nascimento. O show no Auditório Ibirapuera comprova isso com participações de Blubell, Carlos Careqa, Dani Black, Fabiana Cozza, Mario Manga e Simoninha. Mas a maior parte do espetáculo exibirá o duo que Mafalda mantém há anos com o guitarrista americano Paul Ricci. A dupla segue refinando o estilo peculiar de Mafalda: resgatar música italiana de várias épocas, envoltas em uma elegante roupagem de jazz que também reflete sua predileção por bossa nova. "Não vou cantar nenhuma música de novela, talvez para a decepção de muitas pessoas. Sem muita saudade daquilo que já foi, adoro viver meu tempo", diz Mafalda, em português fluente com simpático sotaque.

Folha ­ Por que você convidou outros artistas para uma comemoração tão pessoal?
Mafalda Minnozzi ­ Estou cheia de amigos, de colaborações preciosas, que consegui durante esses anos de andanças. Viajando tanto nesse mundo, a gente vê que sozinho você não é nada. Se não junta as forças, não acontece.
As colaborações apareceram desde sua primeira vinda ao Brasil? 
Consegui me relacionar com um mundo musical de grande talento, algo inacreditável. Tive um pouco de medo no começo, mas depois vi que encontrava carinho com todos que eu conhecia. Martinho da Vila, Milton Nascimento e artistas menores em exposição midiática, como Guinga e tantos. Chico Cesar foi o primeiro que me abriu para esse mundo. Chico disse "Mafalda, continue andando com toda essa beleza que a música italiana carrega, de Sergio Endrigo, Luigi Tenco, que você sempre vai ter as portas abertas". E foi assim mesmo. Chico me falou que a música preferida dele era "Non ho l'eta", de Gigliola Cinquetti. Uma canção dessas, não é que seja preciosa pelo cancioneiro italiano, mas pelas lembranças que ela traz. Ele se lembra do carro de cinema que passava no sertão em que ele morava quando garoto e que anunciava Gigliola Cinquetti no filme "Dio, Come Ti Amo". Tem gerações no Brasil que cresceram com essas músicas. Antes de vir para o Brasil, o que sabia sobre o país? Quando eu entrei na baía de Guanabara pela primeira vez na minha vida, tinha uma visão do Brasil muito ligada à bossa nova, meus ídolos, a partir do João Gilberto, Caetano Veloso, com aquela voz magnífica, Vinicius de Moraes.
A gente traduzia as poesias de Vinicius de Moraes na escola. Na parte da tarde, você podia trazer algum texto do qual gostasse para estudar. Eu levava Salvatore Quasimodo, um dos poetas favoritos, Pirandello, que me acompanhou a vida inteira, Dario Fo e Vinicius. Seus textos eram difíceis para traduzir ao italiano, eram complexos.
Já falava português nessa primeira visita? 
Cheguei em 1996. Não falava nada de português. Depois de um ano eu conseguia conversar, mas ainda estou estudando. Quando eu percebi que o Brasil estava no meu destino, quis aprender esse idioma, comecei a ler muito, lia todos os jornais
Como foi seu encontro com Renato Russo, poucos meses antes de sua morte? 
O Renato Russo não estava muito bem. Eu o conheci em um show da Marisa Monte, na fila do camarim. Ele me reconheceu, porque eu havia feito o "Faustão" no domingo anterior, e me disse que tinha gravado um disco em italiano, "Equilíbrio Distante". Depois ele me presenteou com esse disco, autografado, que perdi recentemente porque entrou água no meu apartamento, perdi coisas preciosas do meu acervo. Ele me falou de sua ligação com a música italiana. Isso me impressionou muito. Eu estava há 20 dias no Brasil e prestes a ir embora. E fiquei. Então Renato foi fundamental na minha vida. Comecei a cantar algumas músicas dele. "La Forza della Vita" foi uma que eu abracei mesmo.
As visitas se tornaram constantes, não? 
Eu continuei trazendo músicas de lá para cá. Já fiz mais de 80 vezes, ida e volta, a viagem da Itália ao Brasil. Todo dinheiro que ganhava eu gastava assim. Fui contratada por uma casa de shows no Rio, na Lagoa, chamada Paradiso. Cheguei ao Brasil para cantar todas as noites, de meia­noite até uma e meia da manhã, um repertório italiano. Mas eles queriam sempre as mesmas músicas, algumas boas, outras não. Todo mundo cantava junto, era extremamente louco. Ainda não havia internet, estava começando a chegar. Então eu imaginava o Brasil como algo muito diferente, não poderia imaginar que existia uma colônia italiana tão forte. Brasil para mim era Jorge Amado, do qual eu li quase tudo, a Bahia e os morros do Rio. A primeira coisa que eu fiz no Brasil foi subir no morro, fui na Mangueira, adotei algumas crianças lá, à distância, um trabalho filantrópico. Começou ali meu envolvimento forte com o país. Mas não poderia imaginar que encontraria tantos italianos e filhos ou netos de italianos. Os donos de bancas de jornais, os taxistas, eram muitos. Pensei se poderia fazer alguma coisa para dar continuidade ao laço que existe entre esses dois povos. Então misturava o repertório no Paradiso, agradava um pouco a mim, um pouco à plateia. Colocava músicas de um Ivano Fossatt, um Sergio Endrigo meio diferente, fazia algumas versões do Chico Buarque em italiano. Algumas agradavam, outras afastavam parte do público, foi um processo muito lento.
O sucesso demorou? 
Algumas músicas minhas entraram em novelas da Globo. Muitos artistas cruzaram meu caminho. Eu ajudei muitos artistas a cantar em italiano. Leonardo e Zezé di Camargo foram dois deles, para que eles cantassem em italiano numa trilha de novela. Cuidava da pronúncia, mas também mostrava um modo de cantar menos melodramático do que aquele que costuma ser associado á canção italiana, mostrava como poderiam ser mais simples. O verdadeiro canto italiano é de Roberto Murolo, um canto popular onde a voz é sutil, delicada. Não é aquilo melodramático, de Puccini, Verdi. Temos hoje uma expressão muito forte desse estilo vigoroso no mundo inteiro, com Il Volo, Andrea Boccelli, mas temos Enrico Caruso, Giuseppe di Stefano, Mario Lanza, que são figuras que cantam com timbres ecléticos. No entanto, muita gente quando vai cantar como eles já vai para o fortíssimo. É como a cultura brasileira no resto do mundo, que passa ser uma coisa extremamente tropical, colorida, agitada, corporal, sensual. É tudo isso, mas não é só isso. Músicas como "Dindi", de Tom Jobim, ou "Inútil Paisagem" são fundamentais para que eu me lembre de Toninho Horta, Fabiana Cozza, Leila Pinheiro. São exemplos de como pode ser eclético, até Cartola.
Como será o show no Auditório Ibirapuera? 
Não vou cantar nenhuma música de novela, talvez para a decepção de muitas pessoas. Claro que devo muito a "Esperanza", essa novela colocou o Brasil todo cantando comigo em 2002, mas eu tenho de fazer algo que seja coerente com o que faço hoje. Sem muita saudade daquilo que já foi, adoro viver meu tempo. Gosto de nascer de novo a cada dia. Tenho que dialogar com a minha linguagem atual, que é jazz, é livre como nunca fui antes, algo introspectivo mas comunicativo. Mas "Dio, Come Ti Amo" pode entrar, com o instrumental talentoso de Mario Manga. 
E, como nos discos, cantará em italiano, português, inglês e francês? 
Sim. Às vezes o idioma nos limita. Acho que vai chegar uma hora em que vou me sentir mais João Bosco, cantando com sons guturais, algo que não seja a palavra. Um idioma, uma só bandeira, para mim é pouco. Em agosto, eu e Paul Ricci nos apresentamos no Birdland [casa de jazz badalada de Nova York]. Uma cantora como eu estar ali é muito estranho. E não é que marcaram de novo para fevereiro? O público pediu minha volta. Com o mesmo repertório, carrego para todos os ligares o Brasil, o jazz, o improviso. Vou cantar no show com Simoninha uma música do pai dele que foi sucesso enorme na Itália. No Natal, eu me apresentei com Milton Nascimento em Petrópolis, e quando eu comecei a cantar "Travessia" em italiano, Milton me deu um sorriso que foi de uma riqueza tão grande que justifica todo esse caminho que percorri. 
Fonte Oficial Folha de São Paulo

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